O presidente Michel Temer afirmou nesta sexta-feira, em um firme pronunciamento, ser alvo de uma “perseguição criminosa disfarçada de investigação” no âmbito do chamado inquérito dos portos conduzido pela Polícia Federal, e disse que, se pensam “ilusioriamente” que irão derrubá-lo, não vão conseguir.

“É uma perseguição disfarçada de investigação”, afirmou, lembrando que há quase um ano —logo após a divulgação da delação da J&F que o envolveu diretamente— tinha dito que não iria renunciar. “Se pensam ainda que ilusioriamente que vão me derrubar, não irão conseguir”.

Temer fez questão de rebater reportagem publicada nesta sexta-feira pelo jornal Folha de S. Paulo, segundo a qual a PF vê indícios de que ele teria lavado dinheiro com transações imobiliárias envolvendo familiares. De acordo com o jornal, a investigação aponta até o momento que Temer recebeu, por meio de um amigo, ao menos 2 milhões de reais de propina em 2014, mesmo ano em que foram feitas reformas em valores semelhantes em propriedades de familiares do presidente.

No início da fala, Temer afirmou que estão lançando “mentiras” que atingem a família dele e um dos filhos que tem 9 anos, e ressaltou que não faria o pronunciamento de maneira institucional, mas para contestar questionamentos morais contra ele.

O presidente, com 77 anos, disse que trabalha há mais de 60 anos e tem condições financeiras suficientes para bancar os imóveis que seriam apontados como suspeitos pela polícia de transações irregulares. Temer afirmou ainda que as aquisições e reformas ocorreram “absolutamente” dentro da lei e foram devidamente comprovadas nas declarações de imposto de renda.

Presidente Michel Temer durante conferência em Brasília 22/08/2017 REUTERS/Adriano Machado

“Aliás, qualquer contador, pessoa de bem, professor de matemática, consegue concluir que ao longo do tempo eu obtive recursos para comprar os imóveis e reformar os imóveis”, disse. “Só um irresponsável, mal-intencionado, ousaria me incriminar, minha família, meu filho, como lavador de dinheiro”, rebateu.

O presidente classificou as insinuações de “revoltantes” e “disparate”, e disse considerar “curioso” o fato de que não consegue ter acesso aos autos porque sempre lhe é dito que as diligências estão sendo feitas e não seria possível repassar o inquérito por estar sob sigilo.

Temer afirmou, em tom de ironia, que a imprensa não consegue as informações invadindo a PF de “madrugada” para ter “sorrateiramente” acesso a esses dados. “Alguém vaza esses dados e a imprensa legitimamente divulga”, disse. “Os autos são fornecidos por quem preside o inquérito, quem comanda o inquérito, seja como for”.

O presidente afirmou que vai sugerir ao ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, que apure internamente como se dão esses vazamentos “irresponsáveis”. Ele disse que jamais teve a oportunidade de apresentar documentos que apontam a licitude das operações, como escrituras.

No final da tarde, o ministro divulgou nota informando que havia determinado ao diretor-geral da PF, Rogério Galloro, a “imediata apuração” do possível vazamento de informações ocorrido no inquérito dos portos.

Em nota, a Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) rebateu as declarações de Temer e pede serenidade.

“É muito comum que investigados e suas defesas busquem, por todos os meios, contraditar as investigações. Entretanto, é necessário serenidade, sobretudo daquele que ocupa o comando do país, para que suas manifestações não se transformem em potenciais ameaças e venham a exercer pressão indevida sobre a Polícia Federal”, afirma a ADPF.

“A ADPF reitera que a instituição não protege, nem persegue qualquer pessoa ou autoridade pública, apenas cumpre seu dever legal de investigar fatos e condutas tipificadas como crimes”, acrescenta a associação.

No comunicado, a ADPF destaca que no caso específico, “vários documentos e peças das diligências estão disponíveis ao público no sistema de processo eletrônico do Supremo Tribunal Federal”, mas “defende a apuração de supostos vazamentos causados por qualquer das instituições que manuseiam os autos”.

PRORROGAÇÃO

Temer questionou o fato de a PF ter pedido novamente a prorrogação do inquérito por 60 dias. Essa demanda foi apresentada na véspera ao ministro Luís Roberto Barroso, relator do inquérito, que pediu a opinião da Procuradoria-Geral da República a fim de decidir posteriormente.

Para o presidente, as sucessivas prorrogações do inquérito têm por objetivo deixá-lo numa situação de “incômodo institucional”. Segundo Temer, chefes de nações estrangeiras têm revelado a ele a admiração pelos “extraordinários” feitos em menos de 2 anos de governo.

“A imagem que se tem lá fora do país é positiva”, disse. “E alguns tentam desmoralizar a figura institucional da Presidência da República para tentar atrapalhar o natural progresso do país”.

Ao fim do pronunciamento, Temer disse que vai “mais tranquilo” para o encontro com o presidente do Chile, que veio, segundo ele, conhecer os progressos do Brasil e com o objetivo de buscar fortalecer as relações comerciais entre os dois países.

Reportagem de Ricardo Brito/Reuters